HISTÓRIAS DA NOSSA TERRA |
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por: Vivaldo Quaresma Para comemorar a sua formatura, em Julho de 1868, o jovem poeta benfeitense José Simões Dias, então com 24 anos de idade, recém-formado em Teologia, pela Universidade de Coimbra, organizou um almoço num conhecido botequim da lusa Atenas, juntamente com vários colegas de curso, em que participaram familiares e amigos próximos dos novéis doutores. Entre os presentes, maioritariamente usando capa e batina, como era de praxe e uso obrigatório naquela época, na academia, e de alguns professores convidados que usavam fraque e cartola, encontravam-se alguns jovens boémios que abandonaram o curso de Teologia e se formaram em Direito e que também se vieram a distinguir no mundo das letras, como: João Penha, Teófilo de Braga, Emídio Navarro, Cândido Figueiredo, e o muito jovem Guerra Junqueiro, entre outros. E, entre os convidados e familiares, que usavam um traje burguês citadino, encontrava-se um homem de aspecto rude e vestes de campónio, que destoava dos restantes presentes, usando um colete de cotim e camisa de riscado; chapéu preto de abas largas e lenço no pescoço; calças com safões e botas de atanado com cardas nas solas e sujas de lama. Um dos estudantes que assistia à recepção dos convidados, pergunta a Simões Dias: - Mas, quem terá convidado aquele labrego? Simões Dias responde-lhe calmamente, embora visivelmente surpreendido com a pergunta e com o modo altivo e arrogante com que o seu amigo se referia àquele convidado, que apenas se distinguia dos demais pela sua indumentária, embora o traje académico de então, até fosse um produto esteticamente inferior à maior parte das peças de vestuário usadas pelos camponeses da serra. E diz-lhe: - Aquele "labrego", que ainda não conheces, mas como tão injusta e inadequadamente lhe chamas, não é um letrado mas é um homem de bem, cristão fervoroso, bom marido e bom pai, que fez uma longa viajem de mais de 100 quilómetros, por montes e vales, para aqui poder estar hoje, comigo, que o convidei, porque a ele devo toda a minha existência e a ele dediquei o meu curso, pois foi graças a ele que me formei e aqui me encontro! E dizendo isto, retirou-se, não dando oportunidade ao seu indelicado amigo para se justificar ou pedir-lhe desculpas pela descortesia e vulgaridade, tendo ido para junto de seu pai, sorrindo-lhe, abraçando-o e servindo-lhe vinho para comemorar o encontro, pois já não o via há quase um ano… E rodeando-o de atenções e carinho, antecipando já o desgosto que lhe iria causar dentro de algumas semanas pois planeava casar em segredo e partir para Elvas com a sua bem amada esposa, sem o seu conhecimento e contra a sua vontade, posto que o desejava padre... Mas, isso, é uma outra história: Uma história de amor!
![]() * Um labrego é, por definição, para além do sentido já por si depreciativo da própria palavra, uma pessoa rude e sem educação, que vive no campo e tem o aspecto grosseiro de um campónio ignorante; um aldeão tosco e boçal. |
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