Antigas ilusões, meus sonhos d'oiro,
Tantos sonhos de amor e de ventura,
Que não voltarão mais,
Quem vos levou, meu único tesouro,
Deixando-me perdido em selva escura,
Em luta com meus ais?
Figurei-te no altar de uma esperança,
Como se mão profana ali não fosse
Tocar-te, pomba ideal!
Não me saía nunca da lembrança
O teu sorriso, tão sereno e doce,
Sorriso sem igual!
Agora trevas, trevas, tudo trevas,
Que outra coisa não sei o que é a vida
Para quem não vê luz!
Nem tu, por mais que faças, já me elevas,
A não ser ao calvário onde erguida
Campeia a minha cruz!
Ingénua crença a minha! Eu que julgava
Que nunca o vento adverso apagaria
A luz de tanto amor,
Porquanto era essa luz quem me guiava
Na estrada que, sorrindo, percorria
Sem sombra de temor;
Eu que fantasiei, como em delírio,
Quanto há de belo, quanto de sublime
Num peito virginal,
Curvo-me agora ao peso do martírio,
Como se dobra ao peso da água o vime,
Fementida vestal!
Quisera ainda amar-te como dantes,
Quisera crer em ti, bem que mentiste,
Por meu mal, tanta vez!
Mas para que, se rápidos instantes
Durou essa ilusão amarga e triste
Que em fumo se desfez!
Recordação fatal, quem te apagara,
Que nunca mais pudesse em vida minha
Avivar tanta dor!
Lembranças tristes, más, quem vos levara,
Como levaram a ilusão querida
Desse infeliz amor!
Desfaz-se no ar a sombra à luz da aurora,
Desfaz-se no ar a névoa prenhe d'água
Que no monte esvoaça!
Tudo se apaga e some e se evapora...
Só esta imensa e incomparável mágoa,
Só esta dor não passa!
J.Simões Dias
in: Peninsulares
|